domingo, 12 de fevereiro de 2012

Sérgio Cabral articulou prisões de líderes no dia anterior à greve das forças policiais

Leonardo Boff: "A responsabilidade pela greve dos policiais militares deve ser tributada ao poder público"

O governo do Estado do Rio de Janeiro começou a articular a prisão dos principais líderes da greve das entidades de classe da segurança pública fluminense na última quarta-feira (8), portanto, um dia antes de a greve ser oficialmente deflagrada. Em reuniões fechadas no Palácio Guanabara, o governador Sérgio Cabral (PMDB), a chefe de Polícia Civil do Rio, Martha Rocha, o presidente da Alerj (Assembleia Legislativa), Paulo Melo (PMDB), entre outros representantes do governo, listaram os principais personagens do movimento.

Na manhã de hoje, passadas quase 12 horas do anúncio oficial da greve, a Justiça expediu 11 mandados de prisão contra os policiais que estavam à frente da paralisação, entre os quais dois coronéis e um major. No total, 17 policiais foram detidos, entre os quais dez lideranças --e mais de 130 PMs responderão asindicâncias e/ou inquéritos administrativos por insubordinação (se recusaram a sair do quartel).

O Executivo fluminense já esperava que o impasse não seria resolvido. Há dois dias, o deputado estadual Paulo Melo chamou o diretor-jurídico do Sindpol(Sindicato dos Policiais Civis), Francisco Chao, para conversar em seu gabinete, e exigiu que ele fosse sozinho. Durante o encontro, o parlamentar perguntou "O que vocês querem?".

O policial civil respondeu que todas as reivindicações da categoria já tinham sido "mais do que divulgadas desde 2007". Melo argumentou que a Polícia Civil seria "diferenciada" em relação a outras forças de segurança pública, em função do grau de instrução de seus membros, e ouviu de Chao que os policiais civis tinham assumido um compromisso moral com os companheiros da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros.

O representante do Sindpol respondeu ainda que bastaria "equiparar [condições de trabalho] com a Polícia Federal" para resolver o problema, mas ressaltou que aPM entraria em greve. O presidente da Alerj respondeu que não se preocupava tanto com bombeiros e PMs, pois bastaria "prender as lideranças". Era a estratégia do governo para assustar os demais grevistas e esvaziar a mobilização. Cabral alimentava a esperança de convencer a Polícia Civil a não ingressar no movimento grevista.

Justamente naquela noite, durante a assembleia, o "Jornal Nacional" exibia uma reportagem baseada em gravações telefônicas autorizadas pela Justiça que revelaram conversas do cabo Benevenuto Daciolo, líder do movimento S.O.S Bombeiros, discutindo estratégias para fortalecer o movimento grevista no Rio. O bombeiro foi preso ao desembarcar no aeroporto Internacional do Galeão quando voltava de Salvador, na Bahia --Estado que também tem parte de PM em greve.

A tentativa derradeira de desvincular a Polícia Civil da inevitável greve dos militares se deu quando o governo aprovou, na noite de quarta, as mudanças noprojeto de lei que determina a antecipação de reajuste salarial para as categorias, o que melhorou substantivamente a proposta original --aumento de 39% em duas parcelas (fevereiro de 2012 e fevereiro de 2013). O PL 1.184/12 foi aprovado naAlerj no dia seguinte por 59 votos a um.

A última cartada de Cabral, porém, provocou gargalhadas dos policiais presentes na assembleia. Depois de ler a nota oficial do governo para os presentes, o presidente do Sindpol, Carlos Gadelha, afirmou: "Eu acho engraçado que o governo não chega para a gente para perguntar se a proposta está boa ou ruim. O que vocês acham? Eu continuo achando que a gente deve fazer greve". A massa apoiou.

O episódio marcou pontualmente o fim das negociações entre os líderes do movimento e a chefe de Polícia Civil do Rio, Martha Rocha, que falava em nome do governador. Durante a assembleia, Rocha fez de três a cinco ligações para Francisco Chao, considerado o principal interlocutor entre os policiais civis insatisfeitos com suas condições de trabalho e o poder público, e também entrou em contato com o presidente do sindicato, Carlos Gadelha.

Por volta das 21h15, Chao pediu a palavra e transmitiu a última mensagem da chefe da Polícia Civil: "Meu dever moral é passar essa mensagem para vocês. A chefe da Polícia Civil do Rio está pedindo para que a gente não entre em greve". Segundo ela, caso os agentes não "embarcassem" na paralisação capitaneada por policiais militares e bombeiros, o governo abriria uma "segunda rodada de negociações". A massa rejeitou em coro unânime. E um indicativo de greve foi aprovado ao fim da assembleia.

Matéria originalmente publicada no UOL Notícias